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Hemorio representa o Brasil em estudo inédito sobre doença falciforme

Pesquisa das universidades americanas de Maryland e Pittsburgh traz novos protocolos de tratamento
Imagem: Divulgação

O Hemorio é o representante do Brasil em estudo clínico inédito sobre a doença falciforme conduzido pelas universidades americanas de Maryland e Pittsburgh. A troca de experiências entre as instituições, especialmente em relação aos novos tratamentos, tem como objetivo evitar complicações tardias em pacientes adultos.

Referência na assistência, o Hemorio tem uma média de atendimentos de 4 mil falcêmicos, inclusive gestantes e crianças, com utilização de diversas técnicas de tratamento, que são referência hoje para estudos internacionais. O médico pneumologista e professor Mark T Gladwin e o diretor-geral do hemocentro de Pittsburgh e professor da Faculdade de Medicina de Pittsburgh, Darrell Triulzi, estiveram no auditório da instituição, na última quinta-feira (30/11), para expor os resultados dos estudos e conhecer os pesquisadores brasileiros durante o simpósio “Novos Tratamentos para Doença Falciforme”.

O Rio de Janeiro registrou quase 3 mil internações por conta da doença em hospitais da rede estadual, no período de janeiro de 2022 a setembro de 2023, em unidades como o Hospital Estadual Prefeito João Baptista Caffaro, em Itaboraí; Hospital Estadual Azevedo Lima, em Niterói; Hospital Estadual Dr Ricardo Cruz, em Nova Iguaçu; Hospital Estadual Carlos Chagas, Hospital Estadual Getúlio Vargas e Hospital Universitário Pedro Ernesto, na Zona Norte; Hospital Estadual Alberto Torres, em São Gonçalo, entre outras, além do Hemorio (Instituto Estadual de Hemotologia Arthur Siqueira Cavalcanti), que concentra o maior número de atendimentos do estado.

Diretor geral do Hemorio, Luiz Amorim enfatiza que a parceria vai ampliar as pesquisas clínicas, com o uso de novos equipamentos e medicações, possibilitando a redução das dores crônicas, que acometem a maioria das pessoas que convive com o diagnóstico na vida adulta. A doença, que tem origem hereditária e atinge predominantemente a população negra, é caracterizada pela alteração dos glóbulos vermelhos do sangue, tornando-os parecidos com uma foice, daí o nome falciforme. Essas células têm sua membrana alterada e rompem-se mais facilmente, causando anemia, um dos aspectos mais comuns da doença, entre outras questões, como alterações da frequência cardíaca e complicações do rim e do fígado.

“Vamos participar de um estudo mundial liderado por essas universidades para novos tratamentos da doença falciforme, com a meta de evitar complicações mais tardias, que representam um problema para pacientes falciformes quando chegam à idade adulta. Nossos colegas americanos trouxeram ainda novos equipamentos para diagnóstico como, por exemplo, um anel que avalia a frequência cardíaca em tempo real, além da oximetria. Esse equipamento, que deve ser usado por sete dias, permite que o paciente seja monitorado em seu dia a dia até enquanto está dormindo ou andando pela casa. Também conhecemos uma nova ferramenta para avaliar a dor. Isso é muito importante porque quem tem doença falciforme convive com a dor e precisamos melhorar a qualidade de vida. Poderemos mapear a intensidade e a percepção da dor por meio do uso de cores e de animação que mostra diferentes partes do corpo, sendo o vermelho a escala mais intensa”, explica Amorim.

Um dos protocolos de tratamento no Hemorio prevê também a transfusão de sangue, sendo utilizada por 58% dos pacientes na unidade. Hoje, a instituição conta com um moderno equipamento para o procedimento, que é realizado de maneira automatizada, com uma média de 20 atendimentos de segunda a sexta, registrando bons resultados, mesmo diante da dificuldade em obter o sangue com fenótipo específico, com as especificidades dos anticorpos imprescindíveis ao procedimento. São necessárias muitas bolsas ao longo do ano por indivíduo. As situações clínicas para a transfusão envolvem a prevenção primária e secundária de AVCs em crianças e adolescentes, anemia aguda, preparação para cirurgias e priapismo (ereção dolorosa, de duração variável e não relacionada a estímulo sexual).

Estudiosa do tema, a hematologista brasileira Clarisse Lobo que estava presente ao simpósio, ressalta que a doença falciforme é reconhecidamente um grave problema de saúde pública mundial, com grande impacto na morbimortalidade da população acometida pela doença.

“No Brasil, a doença é reconhecida pelos profissionais de saúde como de alta prevalência há vários anos, por conta da nossa população autodeclarada parda ou negra. O problema foi também reconhecido pelo Ministério da Saúde, que, a partir de 2001, introduziu a fase II do programa brasileiro de triagem neonatal, com o objetivo de identificar precocemente a pessoa com doença falciforme, por meio do Teste do Pezinho”, explica a pesquisadora.

Hoje, a Política de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme do Ministério da Saúde representa mais um avanço na abordagem do gene falciforme no Brasil, ajudando na melhoria da invisibilidade desse grande grupo de brasileiros.

“O outro eixo norteador relaciona-se ao acesso a todos os recursos diagnósticos e terapêuticos dirigidos à prevenção e ao tratamento das complicações. Dentro dessa lógica, está o Brasil, que já contava, desde 2002, com portaria que definia os critérios para uso de hidroxiurea (droga mais utilizada para o tratamento) no âmbito do SUS. Agora, por meio da reedição dessa normativa feita em 2010, ampliamos os critérios, colocando nosso país entre os mais avançados em termos de possibilidade de acesso ao fármaco”, disse Clarisse.

De acordo com o professor Mark T Gladwin, que monitora os casos em diferentes países, apenas na Nigéria são 5 milhões de pessoas acometidas com a doença falciforme. No Brasil, estima-se que, atualmente, há entre 60 mil e 100 mil pacientes com doença falciforme de acordo com o Ministério da Saúde.  “O HemoRio é um parceiro necessário ao nosso estudo e já temos 3 pacientes brasileiros em acompanhamento. Nossa preocupação é que os pacientes têm grande morbidade e mortalidade, principalmente em casos de infartos e AVCs, com registro em crianças. As novas técnicas utilizadas nos permitem oferecer mais qualidade de vida”, afirmou Gladwin.