Pesquisadores brasileiros avançam no desenvolvimento de uma vacina que busca atenuar os efeitos da cocaína e do crack no organismo.
O candidato a imunizante da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) concorre ao Prêmio Euro Inovação na Saúde, que reconhece grandes inovações da área médica e incentiva o desenvolvimento de soluções. A vacina anticocaína concorre na categoria Inovação Tecnológica Aplicada em Saúde. Os vencedores das categorias concorrem ao prêmio de Grande Destaque.
“Estamos na final de um prêmio latino-americano que proveria os recursos para terminarmos estas etapas clínicas, caso sejamos finalistas”, afirma o professor do Departamento de Saúde Mental da Faculdade de Medicina e pesquisador responsável, Frederico Garcia.
Votação na premiação
Para votar é necessário ser médico com registro em um dos países com participação da farmacêutica financiadora da premiação. Podem votar profissionais de medicina com registro ativo nos seguintes países: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Uruguai, Paraguai, Peru, Equador, México, Colômbia, Guatemala, El Salvador, Nicarágua, Panamá, Costa Rica, Honduras ou República Dominicana.
Resultados promissores
A etapa dos ensaios pré-clínicos, realizados com animais, mostrou resultados promissores na redução do impacto da droga em camundongos.
Desde então, o projeto concluiu as etapas pré-clínicas, em que foram constatadas segurança e eficácia para tratamento da dependência e prevenção de consequências obstétricas e fetais da exposição à droga durante a gravidez em animais.
Os próximos passos incluem a realização dos estudos clínicos, com voluntários humanos. O pedido deve ser encaminhado à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). De acordo com o professor Frederico Garcia, a pandemia impactou o andamento do projeto e que o avanço para as próximas fases depende de recursos.
Atualmente, não existem tratamentos registrados em agências regulatórias para essas dependências. As alternativas disponíveis são comportamentais ou usam medicamentos que ajudam a tolerar a abstinência ou diminuir a impulsividade.
Segundo Garcia, esse é um problema prevalente, vulnerabilizante e sem tratamento específico. Os estudos pré-clínicos comprovam a segurança e eficácia da vacina nesta aplicação. Ela propõe uma solução que permite aos pacientes com dependência se reinserir socialmente e voltar a realizar seus sonhos.
A candidata a vacina desenvolvida na UFMG induz o sistema imune a produzir anticorpos que se ligam à cocaína na corrente sanguínea. Essa ligação transforma a droga numa molécula grande, que não passa pela barreira hematoencefálica, uma estrutura que regula o transporte de substâncias entre o sangue e o sistema nervoso central.
“Demonstramos a redução dos efeitos, o que sugere eficácia no tratamento da dependência. Pensamos em utilizar o fármaco para evitar recaídas em pacientes que estão em tratamento, dando mais tempo para eles reconstruírem sua vida sem a droga”, detalha o pesquisador.
Outra possibilidade de uso foi observada nos testes em ratas grávidas, que produziram níveis significativos de anticorpos. “A vacina impediu a ação da droga sobre a placenta e o feto. Observamos menos complicações obstétricas, maior número de filhotes e maior peso do que as não vacinadas”, diz Frederico.
De acordo com o especialista, uma vacina para a prevenção primária de transtornos mentais – como no caso da proteção aos fetos gerados por dependentes de cocaína grávidas que forem vacinadas – seria algo inédito no campo da psiquiatria. A patente já foi depositada pela Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica (CTIT) da UFMG.
A proposta visa enfrentar a dependência em cocaína e seus derivados, como o caso do crack, que é uma mistura da substância com bicarbonato de sódio ou amônia. O projeto já concluiu os testes pré-clínicos e busca financiamento para avançar até a etapa com humanos.
“Até então, este projeto foi inteiramente desenvolvido com recursos governamentais. Para restaurar a liberdade das pessoas com dependência e prevenir as consequências fetais precisamos dar início nos estudos com humanos”, completa o professor.